segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

A Estrada

   O que é a vida, senão um caminho longo e tortuoso? Há obstáculos por toda a parte, e poucas oportunidades a serem aproveitadas. Cheguei a uma bifurcação; pra onde ir? À esquerda posso ter o que quero, mas à direita tudo que preciso. Qualquer que seja minha escolha, não posso olhar para trás. O arrependimento não é um caminho, mas um buraco fundo e escuro muito difícil de se sair.
   Direita, então. Parece ser o caminho mais longo, mas se realmente possuir o que preciso, deve valer a pena.
   De repente, ouço um choro; dou mais alguns passos e encontro um bebê deitado no chão, enrolado apenas em uma fina coberta. Seu choro me comove e, na vastidão da estrada, parece ser o único índicio de vida, ecoando no silêncio, como se insistisse em provar que ainda existia. Decido pegar o bebê no colo e balançá-lo levemente, cantando uma canção de ninar ao mesmo tempo. Não funcionou. Ainda chorando alto, ele balança seus braçinhos e alcança minha mão, agarrando meu dedo indicador com sua mãozinha. Como um gesto automático, ele leva meu dedo à boca e começa a chupá-lo instantaneamente, parando de chorar.
   Fome. É claro. Recomeço a andar e não demora muito para o bebê soltar meu dedo e voltar a chorar. Já não aguentava mais quando me deparo com um mendigo velho e magro, sentado no meio-fio com um cigarro encaixado na orelha e duas pedras nas mãos, batendo-as uma na outra incessantemente. Ao me ver, ele levanta assustado com os olhos vermelhos e arregalados e recua alguns passos, visivelmente perturbado.
   - Você tem fogo aí? - perguntou de repente.
   Apesar de ter um isqueiro no bolso, já que também fumo, a figura daquele mendigo me marcou de uma tal forma que não consigo mover minha mão em direção ao bolso, como se a minha consciência agora controlasse meus movimentos. Não posso arruinar ainda mais a vida desse homem.
   - Não, não tenho - menti. - E você não deveria fumar.
   - Por que? - retrucou desconfiado.
   - Porque eles fazem mal à saúde; podem dar câncer e tudo mais.
   Ele me encara por alguns segundos, tentando ver se minha expressão revelava alguma mentira, e logo leva a mão até a orelha e puxa o cigarro, puxando-o para baixo do nariz e dando uma longa fungada.
   - Mas é tão bom! - lamentou-se com os olhos marejados.
   - Eu sei, mas precisa entender que não vale a pena arriscar sua vida por ele.
   Assentindo lentamente, o mendigo larga o cigarro no chão e pisa em cima, com uma cara de quem não sabe se chora ou comemora. Dou um sorriso meio tímido e ele retribui; ele não precisou me agradecer para eu sentir que de alguma forma o ajudei, após vê-lo começar a voltar pelo caminho que eu tinha vindo. Só quando ele já está longe que percebo o silêncio que faz. Olho para baixo e vejo o bebê dormindo profundamente com o próprio dedão na boca. A fome, afinal, era só sono. Tentando não acordá-lo, boto a mão lentamente bolso, retiro meu isqueiro e jogo-o longe. Não vou mais precisar dele. Está tudo bem. 

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