Honra. Está aí uma palavra cada vez menos usada hoje em dia. Isso talvez esteja acontecendo porque o conceito da palavra também está desaparecendo. Quem hoje em dia luta por algo próprio, sem se importar com o que os outros pensam e dizem, passando pelos obstáculos necessários sem ao menos olhar para trás ou pensar em desistir, somente porque fez uma promessa a si mesmo? Poucas pessoas.
A maioria provavelmente diria que isso é bobagem ou burrice (aliás, uma das definições a qual honra virou sinônimo); por que fazer tudo isso só para cumprir uma promessa que sequer tem valor "real", que não vai fazer a mínima diferença nem para a pessoa ou para o resto do mundo? Os antigos samurais, aqueles da antiga aristocracia japonesa, poderiam dar várias razões.
Estes guerreiros acreditavam que a vida na Terra era limitada, mas que o nome e a honra poderiam durar para sempre. Por isso, não temiam a morte e não hesitavam em um campo de batalha, não porque serviam ao imperador e tinham que cumprir suas funções, mas porque tinham que seguir seu próprio código de conduta; eles não tinham que provar nada a ninguém, exceto a si mesmos. Para mostrar como eles levavam a sério, um samurai, caso seu nome fosse desonrado, realizava o seppuku, ritual em que o guerreiro cravava uma tanto (espécie de espada), sua própria wakizashi (espada curta) ou um punhal no lado esquerdo do abdomên, cortando até o lado direito e, por fim, puxando a lâmina de baixo para cima até o peito. Era uma morte lenta e dolorosa, mas para esses guerreiros significava manter a honra intacta, eterna.
É claro que é uma atitude extrema e, obviamente, não recomendo ninguém a enfiar uma faca na barriga caso faça algo de errado; porém, o significado desse ato transcende o literal. Não quer dizer se matar para fugir dos problemas, e sim ter a consciência de que o que fazemos na vida é o que importa, e não a vida em si. E essa consciência vem do Bushido (literalmente "caminho do guerreiro"), o código de honra não-escrito que cada samurai seguia até o fim de sua vida para perpetuar sua honra e/ou de sua família.
Será que não é possível ter um bushido hoje em dia, mesmo que os samurais não estejam mais por aqui? Afinal, para manter sua honra viva, não adianta apenas lembrar deles como sendo fortes e destemidos; é preciso viver a honra, mantê-la viva através da experiência, da luta, da persistência, do respeito. É preciso honrar a honra.
sábado, 29 de janeiro de 2011
segunda-feira, 24 de janeiro de 2011
A Estrada
O que é a vida, senão um caminho longo e tortuoso? Há obstáculos por toda a parte, e poucas oportunidades a serem aproveitadas. Cheguei a uma bifurcação; pra onde ir? À esquerda posso ter o que quero, mas à direita tudo que preciso. Qualquer que seja minha escolha, não posso olhar para trás. O arrependimento não é um caminho, mas um buraco fundo e escuro muito difícil de se sair.
Direita, então. Parece ser o caminho mais longo, mas se realmente possuir o que preciso, deve valer a pena.
De repente, ouço um choro; dou mais alguns passos e encontro um bebê deitado no chão, enrolado apenas em uma fina coberta. Seu choro me comove e, na vastidão da estrada, parece ser o único índicio de vida, ecoando no silêncio, como se insistisse em provar que ainda existia. Decido pegar o bebê no colo e balançá-lo levemente, cantando uma canção de ninar ao mesmo tempo. Não funcionou. Ainda chorando alto, ele balança seus braçinhos e alcança minha mão, agarrando meu dedo indicador com sua mãozinha. Como um gesto automático, ele leva meu dedo à boca e começa a chupá-lo instantaneamente, parando de chorar.
Fome. É claro. Recomeço a andar e não demora muito para o bebê soltar meu dedo e voltar a chorar. Já não aguentava mais quando me deparo com um mendigo velho e magro, sentado no meio-fio com um cigarro encaixado na orelha e duas pedras nas mãos, batendo-as uma na outra incessantemente. Ao me ver, ele levanta assustado com os olhos vermelhos e arregalados e recua alguns passos, visivelmente perturbado.
- Você tem fogo aí? - perguntou de repente.
Apesar de ter um isqueiro no bolso, já que também fumo, a figura daquele mendigo me marcou de uma tal forma que não consigo mover minha mão em direção ao bolso, como se a minha consciência agora controlasse meus movimentos. Não posso arruinar ainda mais a vida desse homem.
- Não, não tenho - menti. - E você não deveria fumar.
- Por que? - retrucou desconfiado.
- Porque eles fazem mal à saúde; podem dar câncer e tudo mais.
Ele me encara por alguns segundos, tentando ver se minha expressão revelava alguma mentira, e logo leva a mão até a orelha e puxa o cigarro, puxando-o para baixo do nariz e dando uma longa fungada.
- Mas é tão bom! - lamentou-se com os olhos marejados.
- Eu sei, mas precisa entender que não vale a pena arriscar sua vida por ele.
Assentindo lentamente, o mendigo larga o cigarro no chão e pisa em cima, com uma cara de quem não sabe se chora ou comemora. Dou um sorriso meio tímido e ele retribui; ele não precisou me agradecer para eu sentir que de alguma forma o ajudei, após vê-lo começar a voltar pelo caminho que eu tinha vindo. Só quando ele já está longe que percebo o silêncio que faz. Olho para baixo e vejo o bebê dormindo profundamente com o próprio dedão na boca. A fome, afinal, era só sono. Tentando não acordá-lo, boto a mão lentamente bolso, retiro meu isqueiro e jogo-o longe. Não vou mais precisar dele. Está tudo bem.
Direita, então. Parece ser o caminho mais longo, mas se realmente possuir o que preciso, deve valer a pena.
De repente, ouço um choro; dou mais alguns passos e encontro um bebê deitado no chão, enrolado apenas em uma fina coberta. Seu choro me comove e, na vastidão da estrada, parece ser o único índicio de vida, ecoando no silêncio, como se insistisse em provar que ainda existia. Decido pegar o bebê no colo e balançá-lo levemente, cantando uma canção de ninar ao mesmo tempo. Não funcionou. Ainda chorando alto, ele balança seus braçinhos e alcança minha mão, agarrando meu dedo indicador com sua mãozinha. Como um gesto automático, ele leva meu dedo à boca e começa a chupá-lo instantaneamente, parando de chorar.
Fome. É claro. Recomeço a andar e não demora muito para o bebê soltar meu dedo e voltar a chorar. Já não aguentava mais quando me deparo com um mendigo velho e magro, sentado no meio-fio com um cigarro encaixado na orelha e duas pedras nas mãos, batendo-as uma na outra incessantemente. Ao me ver, ele levanta assustado com os olhos vermelhos e arregalados e recua alguns passos, visivelmente perturbado.
- Você tem fogo aí? - perguntou de repente.
Apesar de ter um isqueiro no bolso, já que também fumo, a figura daquele mendigo me marcou de uma tal forma que não consigo mover minha mão em direção ao bolso, como se a minha consciência agora controlasse meus movimentos. Não posso arruinar ainda mais a vida desse homem.
- Não, não tenho - menti. - E você não deveria fumar.
- Por que? - retrucou desconfiado.
- Porque eles fazem mal à saúde; podem dar câncer e tudo mais.
Ele me encara por alguns segundos, tentando ver se minha expressão revelava alguma mentira, e logo leva a mão até a orelha e puxa o cigarro, puxando-o para baixo do nariz e dando uma longa fungada.
- Mas é tão bom! - lamentou-se com os olhos marejados.
- Eu sei, mas precisa entender que não vale a pena arriscar sua vida por ele.
Assentindo lentamente, o mendigo larga o cigarro no chão e pisa em cima, com uma cara de quem não sabe se chora ou comemora. Dou um sorriso meio tímido e ele retribui; ele não precisou me agradecer para eu sentir que de alguma forma o ajudei, após vê-lo começar a voltar pelo caminho que eu tinha vindo. Só quando ele já está longe que percebo o silêncio que faz. Olho para baixo e vejo o bebê dormindo profundamente com o próprio dedão na boca. A fome, afinal, era só sono. Tentando não acordá-lo, boto a mão lentamente bolso, retiro meu isqueiro e jogo-o longe. Não vou mais precisar dele. Está tudo bem.
sábado, 22 de janeiro de 2011
Queima de Livros
Eu falhei. Todo o meu esforço se reduziu a pó, esmagado pelas minhas dúvidas e receios. O mundo? Não se importa nem um pouco. Minha família e amigos sim, claro que compartilham da minha dor. Mas o mundo não; ele não pára por minha causa. O ciclo da vida continua, ganhando ou perdendo, calando ou gritando, prazendo ou sofrendo.
Então, o significado de todos esses testes deve ser outro, não pode ser tudo por acaso. Aí é que está; ou, nas palavras de Shakespeare, that's the rub. Como é possível saber o verdadeiro significado das minhas ações, dos meus desejos, das minhas escolhas? Religião? Talvez, mas e os ateus? Como ficam? Será que todos simplesmente vivem, sem parar para pensar no porquê de tudo acontecer como acontece?
Não. Não tem nada a ver com Deus ou destino. Isso são coisas pessoais. O segredo de tudo está na minha frente, na nossa frente: o amor. Aqueles que amo do fundo do meu coração, por mais que eu não demonstre, são a base da minha vida, de tudo o que faço e deixo de fazer. E, assim, tudo faz sentido, porque não há motivo pra batalhar, persistir e se sacrificar sem o amor de alguém envolvido.
Eu falhei, sim. E a culpa é só minha; porém, não me dá o direito de desistir, nem por um segundo. Eu vou continuar aqui, suando e sangrando, porque eu tenho algo o qual vale a pena lutar. E isso é tudo que importa.
Então, o significado de todos esses testes deve ser outro, não pode ser tudo por acaso. Aí é que está; ou, nas palavras de Shakespeare, that's the rub. Como é possível saber o verdadeiro significado das minhas ações, dos meus desejos, das minhas escolhas? Religião? Talvez, mas e os ateus? Como ficam? Será que todos simplesmente vivem, sem parar para pensar no porquê de tudo acontecer como acontece?
Não. Não tem nada a ver com Deus ou destino. Isso são coisas pessoais. O segredo de tudo está na minha frente, na nossa frente: o amor. Aqueles que amo do fundo do meu coração, por mais que eu não demonstre, são a base da minha vida, de tudo o que faço e deixo de fazer. E, assim, tudo faz sentido, porque não há motivo pra batalhar, persistir e se sacrificar sem o amor de alguém envolvido.
Eu falhei, sim. E a culpa é só minha; porém, não me dá o direito de desistir, nem por um segundo. Eu vou continuar aqui, suando e sangrando, porque eu tenho algo o qual vale a pena lutar. E isso é tudo que importa.
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